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INTERIOR MT

Justiça determina mudanças em fazenda onde zootecnista morreu queimado

A Justiça de Mato Grosso decidiu, no último dia 27, que a empresa agropecuária responsável pela Fazenda Ressaca, em Cáceres, a 250 km de Cuiabá, deve adotar medidas de segurança em casos de incêndios e não poderá mais exigir que seus funcionários atuem no combate a incêndios. No ano passado, um zootecnista morreu enquanto apagava o fogo na propriedade.

A morte do trabalhador foi em setembro de 2020. O zootecnista Luciano da Silva Beijo, de 35 anos, foi a óbito após ter quase 100% do corpo queimado enquanto combatia o fogo que se alastrava no local.

Luciano deixou esposa e dois filhos.

O profissional e os demais empregados que o acompanhavam na atividade de combate ao incêndio não eram bombeiros civis, não possuíam capacitação para enfrentar o incêndio que atingiu a propriedade rural e tampouco receberam Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados.

A decisão da Justiça fixou multa de R$ 100 mil em caso de descumprimento. A liminar foi pedida pelo Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT).

Segundo o MPT, a falta de preparação ficou evidente, pois não havia qualquer previsão desse risco no Programa de Gestão de Segurança, Saúde e Meio Ambiente do Trabalho Rural (PGSSMATR) e nos documentos requisitados pelo MPT à empresa.

“Se dificilmente os bombeiros conseguem controlar as queimadas que assolam o Pantanal, não se justifica querer exigir que zootecnistas, operadores de máquinas e trabalhadores rurais em geral tenham que desempenhar atividades de combate direto ao fogo em tais condições”, diz trecho da ação ajuizada em 21 de janeiro pelo MPT.

No curso da investigação, verificou-se que o Programa de Gestão de Segurança e Saúde no Meio Ambiente do Trabalho Rural da empresa, embora assinado em 18 de agosto do ano passado – ou seja, poucos dias antes do acidente de trabalho que consumiu quase 100% do corpo de Luciano da Silva Beijo –, não contempla os riscos ambientais relacionados à fumaça e ao fogo das queimadas.

“Ocorre que, além de anualmente ocorrerem queimadas na região, na época em que foi finalizado o programa em agosto de 2020, já estava claro que o estado estava sofrendo seca recorde e queimadas devastadoras. Então, se havia risco de os trabalhadores serem expostos à fumaça e ao fogo de queimadas, obrigatoriamente deveria ter sido feita a identificação dos riscos ambientais, algo que não foi observado pela ré”, apontou o MPT.

Na liminar concedida na última quarta-feira, o juiz Luiz Fernando Leite da Silva Filho, em atuação na Vara do Trabalho de Cáceres, concordou que a conduta da agropecuária pode expor outros empregados ao risco de novos acidentes.

Ele reforçou que há, no ordenamento jurídico, um conjunto de normas protetivas da saúde e segurança do trabalhador, não sendo possível admitir que a energia laboral do indivíduo seja explorada sem o devido respeito a tais normas, sob pena de flagrante violação à dignidade do ser humano ou, pior, à vida humana.

“Tratando-se de atividade extremamente perigosa, o combate aos incêndios deve ser realizado apenas por profissionais altamente capacitados, integrantes dos quadros do Corpo de Bombeiros Militar ou que exerçam a profissão regulamentada de bombeiro civil. Nem mesmo os brigadistas da empresa devem ser obrigados a combater incêndios já instalados. (…) Ademais, nos casos em que tal combate seja estritamente necessário, para salvaguarda da própria vida do empregado e de terceiros, o mínimo que se exige é que o empregador capacite adequadamente os trabalhadores, segundo as normas técnicas de segurança”.

O magistrado observou, analisando as provas apresentadas pelo MPT, que a empresa, além de não capacitar adequadamente o zootecnista Luciano da Silva Beijo para o exercício da atividade de combate a incêndio, não disponibilizou os Equipamentos de Proteção Individual adequados para diminuir os riscos.

Os EPIs para atividades com esse grau de risco devem proteger os olhos, membros inferiores, membros superiores, cabeça e tronco.

Por causa disso, a Justiça do Trabalho atendeu parcialmente o pedido de tutela de urgência e determinou que a empresa adote três medidas.

Deixar de exigir dos empregados que exerçam a profissão de bombeiro civil a realização de atividades de combate a incêndios já instalados, ressalvada a possibilidade de combate de princípio de incêndio pelos empregados que componham brigada de incêndio, a qual deve estar em conformidade com as normas técnicas dos Bombeiros, que exigem treinamento específico e diversos outros requisitos.

A segunda é a obrigação de fornecer aos empregados que realizarem qualquer atividade de combate a incêndios os EPIs adequados, aptos a assegurar a proteção adequada dos trabalhadores.

Por último, a empresa deverá elaborar, no prazo de 30 dias, novo Programa de Gestão de Segurança, Saúde e Meio Ambiente do Trabalho Rural (PGSSMATR), com a devida identificação dos riscos de acidentes gerados pelas queimadas ocorridas na região.

Outros pedidos

O MPT ainda aguarda a publicação da sentença, inclusive a decisão quanto aos pedidos de indenização. O órgão pede a condenação da empresa ao pagamento de reparação por danos morais coletivos e por danos morais individuais em benefícios dos filhos e da esposa.

O MPT também pede que a agropecuária assuma a obrigação de prover alimentos às crianças e à viúva de Luciano da Silva Beijo, por meio do pagamento de pensão mensal. No caso dos filhos, a pensão deverá ser paga até eles completarem 25 anos.

“Luciano da Silva Beijo deixou uma esposa e dois filhos. Deve-se, então, compensar os familiares que ficaram sem pai e sem esposo. A intensidade do sofrimento e da dor são incomensuráveis. A morte do pai provoca e provocará reflexos em toda a existência dessas crianças, que crescerão privadas de sua presença. Além da morte cruel e dolorosa, o fato de o corpo estar totalmente queimado e desfigurado impediu até mesmo que fosse exposto em um velório normal ”, concluiu o MPT.

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