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PREOCUPAÇÃO

Amazônia emitindo mais CO2: mundo perderá ‘ar condicionado’

John Pacheco/G1

As florestas absorvem cerca de 30% dos gases de efeito estufa despejados na atmosfera. A Amazônia, maior floresta tropical do mundo, representa um ator essencial neste mecanismo.

“Na bacia como um todo, não só no Brasil, a Amazônia guarda uma década de emissões globais de gases de efeito estufa na sua vegetação. Imagine você emitindo, ao longo dos anos, 10 anos de emissão global”, explica o pesquisador Paulo Moutinho, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). “É muita coisa, e isso sem falar na perda da biodiversidade, culturas, e do ar condicionado do planeta, muito relacionado à absorção que a floresta faz do CO2. Ela age como um grande ar condicionado.”

Esse “serviço” é uma consequência do ciclo de precipitações gerado na área pela floresta e sua interação com a atmosfera. A destruição da mata leva a mais emissões de CO2 e diminui a evapotranspiração, que “resfria” o ar.

“Se existe um ponto que podemos chamar de positivo de termos mais CO2 na atmosfera, é que isso estimula a vegetação a fazer mais fotossíntese. Se por um lado, estamos sujando mais a atmosfera, a natureza está tentando compensar o estrago que estamos fazendo retirando esse CO2”, complementa a pesquisadora Luciana Gatti, coordenadora do Laboratório de Gases de Efeito Estufa do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). “O problema é que o estrago que a humanidade está causando é tremendamente maior do que a pobrezinha da natureza está conseguindo compensar da sujeira que nós estamos fazendo no planeta”, resume.

Primeiros alertas já têm 10 anos

O primeiro estudo sinalizando a diminuição da capacidade de absorção de gás carbônico pela Amazônia foi publicado em 2010, baseado em dados das três décadas anteriores. Desde 2014, Luciana alerta sobre o desequilíbrio acelerado do ciclo do carbono na região – causado pela interação entre as mudanças climáticas e a alta das queimadas e o desmatamento.

“Temos essa região do lado leste da Amazônia, que está cerca de 30% desmatada, emitindo 10 vezes mais carbono do que a oeste, que é 11% desmatada. A nossa descoberta é até mais sombria do que a comunidade científica tem ciência. A Amazônia já é fonte de carbono – e eu não sei se isso é reversível”, lamenta a especialista em mudanças climáticas.

“A primeira medida, se quiséssemos resolver o problema, seria proibir totalmente queimada a partir de agosto, quando começa a estação seca. Nós temos leis de proteção ambiental, Código Florestal, que não estão seguidas e estamos vendo as consequências disso. Eu gostaria de ver a CPI do meio ambiente, a CPI da Amazônia, do Pantanal”, completa.

Paulo Moutinho também insiste neste ponto. Segundo ele, a única esperança para restaurar a capacidade de captação CO2 pela floresta é o fim do desmatamento, legal como ilegal, associado ao reflorestamento nas áreas mais degradadas.

“É preciso entender que isso pode ser o início de uma degradação, que precisa ser alertado. Podemos estar chegando mais rápido a um ponto sem retorno, o tiping point, não só pelo desmatamento, mas por uma degradação muito avançada em que você tem mortalidades de grandes árvores”, observa o ecólogo, um dos fundadores do Ipam. “Elas acabam morrendo emitindo muito, abrindo grandes clareiras, que facilitam a entrada do fogo. Num cenário inflamável e de mudança do clima amazônico, pode gerar, na região, uma situação muito diferente em termos de de vegetação do que a gente tem agora.”

Condições climáticas e região mais inflamável antecipam mortes das árvores

Luciana Gatti e sua equipe têm investigado as causas da morte precoce de grandes árvores amazônicas, que necessitam de solo úmido o ano inteiro para sobreviverem. “A seca está mais seca, mais quente e mais prolongada. A estação chuvosa está sendo empurrada para frente. Estamos tendo os impactos negativos da mudança no clima, que nós estamos promovendo também, com o desmatamento. Jogamos mais CO2 na atmosfera e a condição de estresse da floresta está se intensificando”, frisa a doutora em ciências. “Isso leva a aumento da mortalidade das árvores e, sob estresse, várias árvores paralisam a fotossíntese e continuam respirando. Ou seja, mais emissão de CO2 do que absorção.”

A pesquisadora ressalta que os dados de referência de emissões do Brasil desconsideram o impacto das queimadas e dessas mudanças na Amazônia – tema de um novo artigo que deve ser publicado em breve na revista Nature. “Se incluir isso, a situação será tremendamente pior do que os cálculos e emissões preveem hoje”, destaca.

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