O governador Mauro Mendes (DEM) não vai poder tomar nenhuma decisão quanto ao andamento das obras do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) até o encerramento do processo administrativo que gerou a rescisão unilateral de contrato em setembro de 2017, ainda nos tempos do governo Pedro Taques (PSDB). É o que decidiu a desembargadora e relatora do processo no Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Helena Maria Bezerra Ramos, em decisão nesta terça-feira.
Ela deferiu parte de um mandado de segurança com pedido de liminar impetrado pelas três empresas que compõem o Consórcio VLT-Cuiabá no último dia 11 de janeiro. Os advogados do consórcio alegaram que o governo do Estado descumpria sistematicamente o acordado nos primeiros termos de ajustamento mediados pelo Ministério Público e o Judiciário em coisas básicas, como a disponibilização dos contratos firmados para contestação judicial dentro dos prazos legais.
Pra piorar, argumentam, após a delação premiada firmada pelo ex-governador Silval Barbosa, implicando as empresas no esquema de desvio de valores próximos do bilhão de reais em propinas, o governo Taques simplesmente mandou parar o andamento das obras, por meio da rescisão unilateral do contrato e sem justificativa jurídica cabível, além da aplicação de uma multa de 10% do valor do contrato, ou seja R$ 147.761.727,71 milhões, em desfavor do Consórcio VLT, na percepção dos advogados do consórcio.
“Alegam que apresentaram defesa prévia no processo administrativo em 30 de outubro de 2017, alegando o descabimento das acusações e a incompatibilidade do ato de rescisão com o conteúdo da delação, postulando que ao menos se aguardasse o desfecho das apurações, antes de se extrair qualquer consequência de maior gravame e, sucessivamente, pugnaram pela abertura de etapa instrutória, de forma a possibilitar o exercício efetivo do contraditório e ampla defesa, com ampla produção de provas; tendo na mesma oportunidade, apresentado exceção de suspeição contra um dos membros da comissão processante”, citou a desembargadora na decisão.
Segundo os empresários, só ficaram sabendo pela imprensa sobre o rompimento do contrato, quando foi publicado no Diário Oficial do Estado, no dia 04 de dezembro de 2017, um extrato de termo de rescisão contratual unilateral, “genérico” e sem menção a quem o subscreveu. O Governo teria simplesmente deixado de comunicar as empresas sobre o ato e a publicação, além de não ter sequer a fineza de enviar despacho intermediário no bojo do processo ou de convocação delas para eventuais diligências.
Como estavam sem nem mesmo as cópias do contrato, foram prejudicados em seu prazo recursal, mesmo após dois pedidos ignorados pelo governo. Isso feriu de morte um dos princípios básicos do direito: o direito à ampla defesa e ao contraditório, entendeu a desembargadora.
“Da análise dos autos, verifico, prima facie, a presença dos requisitos para o deferimento em parte da medida pretendida. Isso porque, analisando os documentos juntados pelas autoridades impetradas, observa-se, a priori, a fumaça do bom direito em favor das impetrantes, porquanto, apesar de oportunizado o direito de se defender no processo administrativo de rescisão contratual, no qual estas apresentaram defesa preliminar, fora inobservado o devido processo legal após a prolação da decisão administrativa que determinou a rescisão unilateral do contrato administrativo, porquanto mesmo não tendo havido a notificação das empresas impetrantes acerca de tal ato, foi lavrado o respectivo termo de rescisão unilateral, com publicação no Diário Oficial do Estado de Mato Grosso de forma parcial, em dissonância com o que estabelece o artigo 78, parágrafo único, da Lei 8.666/1993”, escreveu Helena Maria Bezerra Ramos.
O governo do Estado rompeu o contrato alegando que as empresas procederam em atos ilegais, com promessa e pagamento de vantagens a agentes públicos, conforme Silval entregou na delação premiada. As empresas do consórcio taxaram as falas do ex-governador de “descabidas” e as acusações de “infundadas” posto que baseadas somente no depoimento e “sem materialidade” documental alguma.
Nova ocorrência, entendeu a desembargadora de erro jurídico, já que o processo ainda corre na justiça. “Nesse aspecto, vislumbra-se, a priori, que a despeito dos motivos apontados para justificar a rescisão contratual, o procedimento rescisório adotado pelas autoridades impetradas aponta para possível violação do previsto no artigo 78, parágrafo único, da Lei 8.666/1993, que condiciona a aplicação de penalidades administrativas ao prévio contraditório das empresas impetradas. Ressalto, por oportuno, que embora as autoridades impetradas tenham juntado documento comprovando que em 19 de dezembro de 2017, encaminharam por correio com AR notificação às impetrantes do termo de rescisão unilateral, tal fato não garante a observância aos princípios do contraditório e ampla defesa, na medida em que já teria sido expedido o termo de rescisão contratual e não apenas decisão de rescisão do contrato”, fundamenta.
As empresas alegaram que os atrasos na conclusão se deram por “uma série de infortúnios”, tais como a demora de oito meses para receber a primeira medição e a demora do Estado em concluir os processos de desapropriação para o andamento das obras. Entretanto, escreveram os advogados, não era esse o motivo do pedido de liminar, pois já são alvo de outra ação a correr na Primeira Vara Federal. “Ante o exposto, defiro em parte a liminar pleiteada, tão somente para determinar que as Autoridades Impetradas se abstenham de tomar qualquer medida com base no Termo de Rescisão Contratual até decisão do recurso administrativo já proposto pelas Impetrantes, ante a caracterização de eventual ofensa aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, até julgamento de mérito pelo Órgão Colegiado deste Sodalício. Notifiquem-se as autoridades coatoras, para prestar as informações pertinentes, no prazo legal, nos termos do art. 7º, I, da Lei nº 12.016/09. Dê-se ciência à Procuradoria-Geral do Estado. Após, abra-se vista à douta Procuradoria-Geral de Justiça”, encerra Helena Maria.