A Justiça dá início, nesta segunda-feira (18), às audiências de instrução do processo que investiga a morte do jogador de futebol Daniel Correa Freitas na 1ª Vara Criminal de São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba.
Sete pessoas são rés na ação: Edison Luiz Brittes Júnior, Cristiana Rodrigues Brittes, Allana Emilly Brittes, Eduardo Henrique Ribeiro da Silva, Ygor King, David Willian Vollero Silva e Evellyn Brisola Perusso.
A defesa de Ygor King e de David Silva chegou a pedir o adiamento das audiências, mas o pedido foi indeferido pela juíza Luciani Martins de Paula.
A expectativa é a de as audiências de instrução continuem até quarta-feira (20).
Primeiro, devem ser ouvidas as testemunhas de acusação. Depois, as de defesa. Em seguida, vêm o interrogatório dos réus e as alegações finais – que é a apresentação dos argumentos finais das partes envolvidas.
Por fim, a juíza decide se os réus enfrentam, ou não, o júri popular.
Nesta segunda-feira, devem ser ouvidas 10 testemunhas de acusação. Entre elas, a mãe de Daniel, Eliana Aparecida Correa Freiras; a tia do jogador, Iolanda Regina Correa de Assis; e a ex dele, Bruna Larissa Ferreira Martins.
Daniel, de 24 anos, foi achado morto na Colônia Mergulhão, na zona rural de São José dos Pinhais em 27 de outubro. Ele foi parcialmente degolado e teve o órgão genital mutilado.
Edison Brittes confessou à polícia ter matado o jogador. Ele diz que Daniel Correa tentou estuprar a esposa dele, Cristiana Brittes, em uma festa na residência deles. O evento era em comemoração ao aniversário de 18 anos de Allana Brittes, filha do casal.
Eduardo da Silva, Ygor King, David Silva, Evellyn Perusso, convidados da festa, também foram acusados de envolvimento na morte do jogador.
Dos sete réus, Evellyn Perusso é a única ré que não está presa.
A festa
Segundo a Polícia Civil e depoimentos de testemunhas, a festa de Allana Brittes começou na noite de 26 de outubro, sexta-feira, na Shed, uma casa noturna no bairro Batel, em Curitiba.
Ele e um amigo foram convidados por Allana para a comemoração e foram para o bar por volta da meia-noite. Edison e Cristiana Brittes também estavam na festa, que tinha mais de 80 convidados e bebida à vontade.
Um vídeo gravado por um convidado mostra o jogador na festa.
A comemoração continuou na manhã seguinte, por volta das 6h da manhã, na casa de Edison Brittes, para onde foram 14 pessoas, incluindo Daniel Correa.
Uma testemunha declarou à polícia que todos ficaram no fundo da casa bebendo e conversando, e que, em seguida, Cristiana e Allana Brittes foram dormir. Minutos depois, Daniel Correa saiu da vista do grupo.
Ainda conforme o depoimento de testemunhas, na sequência, o jogador foi flagrado por Edison Brittes deitado na cama de Cristiana Brittes. Momentos antes do flagrante, Daniel Correa mandou fotos para um amigo deitado ao lado dela.
O delegado Amadeu Trevisan, da Polícia Civil de São José dos Pinhais, disse, porém, que não houve tentativa de estupro.
O crime
Segundo a polícia e os laudos periciais da Polícia Científica, Daniel Correa começou a ser espancado por Edison Brittes ainda dentro do quarto, por volta das 8h.
Eduardo da Silva, Ygor King e David Silva, convidados para a comemoração na casa dos Brittes, também agrediram o jogador.
A investigação policial aponta que Daniel Correa estava bastante alcoolizado e não teve como reagir às agressões.
Conforme a Polícia Civil, Edison Brittes, então, colocou o jogador nu no porta-malas para que ele fosse morto fora da casa e dirigiu por cerca de 20 quilômetros até chegar ao matagal onde a vítima foi deixada.
De acordo com o Ministério Público do Paraná (MP-PR), Daniel Correa foi mais uma vez espancado pelos jovens que acompanharam Edison Brittes no banco traseiro do carro.
O Instituto Médico-Legal (IML) constatou que Daniel Correa foi carregado por mais de uma pessoa até o local onde o corpo foi deixada. A faca usada no crime foi jogada em um riacho e não tinha sido encontrada até a última atualização desta reportagem.
Depois do assassinato, Edison Brittes e os três jovens voltaram para a casa da família. Edison Brittes, então, ordenou que todos limpassem os resquícios de sangue que na casa, ainda segundo o relato de testemunhas.
No dia seguinte, Allana Brittes mandou mensagens para as pessoas que estavam na casa para combinar um encontro em um shopping de São José dos Pinhais.
Nesse encontro, segundo a polícia, Edison Brittes combinou uma versão diferente do crime com acusados e testemunhas. A versão dizia que Daniel Correa tinha ido embora mais cedo da festa com vida.
Contato com a família de Daniel
Segundo a família de Daniel Correa, Edison e Allana Brittes entraram em contato com a mãe e a tia do jogadordois dias após a morte do jogador.
Questionada pela família onde estaria a vítima, Allana Brittes respondeu que não sabia dele, que não houve briga na casa dela e que o jogador foi embora, sozinho, por volta das 8h de sábado.
Em entrevista, a mãe do jogador pediu punição máxima aos sete acusados.
Depoimentos à polícia
Veja abaixo um resumo do que cada réu disse em depoimento à polícia:
– Edison Brittes – disse que agiu “sob forte emoção” ao ver Daniel Correa deitado na cama com Cristiana Brittes. Segundo a defesa dele, houve tentativa de estupro. O empresário falou também que queria humilhar o jogador e abandoná-lo nu fora da casa da família.
Edison Brittes, no entanto, preferiu ficar em silêncio quando foi questionado sobre como o jogador foi morto. Ele assumiu a autoria do crime sozinho.
– Cristiana Brittes – disse que acordou com Daniel Correa deitado sobre ela. Ela afirmou que notou que o jogador estava de cueca e que, então, começou a gritar assustada. Cristiana disse ainda que o jogador estava “excitado”, “trajando apenas cueca” e que passava a mão pelo corpo dela.
A mulher de Edison Brittes afirmou ainda que, enquanto gritava, o jogador dizia: “Calma, é o Daniel”.
– Allana Brittes – disse que, depois de ouvir gritos da mãe, foi ao quarto de Edison e de Cristiana Brittes e encontrou o pai segurando Daniel Correa pelo pescoço, “como se o enforcasse”.
A mãe, segundo Allana Brittes, já não estava mais no quarto porque tinha ido procurar ajuda. Logo depois, ao encontrá-la, a filha revelou à polícia que Cristiana Brittes disse que Daniel Correa tentou estuprá-la.
– Eduardo Henrique da Silva – admitiu que espancou o jogador, mas disse que não teria aceitado participar das agressões se soubesse que Daniel Correa seria morto. Falou também que Edison Brittes saiu de casa com o objetivo de “castrá-lo” e abandoná-lo na rua.
– Ygor King e David William – afirmaram em depoimento que pediram para que Edison parasse de bater no jogador e que agiram por medo. David da Silva disse também que Edison Brittes mudou de ideia e decidiu matar Daniel Correa depois de ver algo no celular do jogador.
– Evellyn Brisola Perusso – disse que Edison Brittes Júnior “ordenou” que ela e outros convidados limpassem as manchas de sangue que ficaram pela casa depois das agressões. Também falou que que viu Cristiana Brittes chamando Allana Brittes e dizendo: “Ajuda, desce, senão seu pai vai matar o menino”.
O inquérito policial durou um mês e 20 pessoas foram ouvidas.
A denúncia
O MP-PR apresentou a denúncia contra os sete investigados no dia 27 de janeiro. Para o promotor João Milton Salles, cinco delas devem responder por homicídio.
O entendimento do MP-PR é que Edison Brittes, Eduardo da Silva, Ygor King e David Silva devem responder por homicídio qualificado por motivo torpe, meio cruel e impossibilidade de defesa da vítima.
Segundo o promotor, Cristiana também foi denunciada por homicídio por ter “orientado-os a prosseguirem com o justiçamento do jogador” fora da casa.
Todos foram denunciados por fraude processual por terem limpado a casa na tentativa de esconder as marcas do crime.
Eles também foram denunciados por corrupção de menor porque na casa havia uma adolescente, que foi cooptada para ajudar na limpeza dos vestígios de sangue na casa.
Evellyn Perusso é a única que não tinha sido indiciada pela polícia. Ela foi acusada de denunciação caluniosa e falso testemunho.
Segundo o promotor, a jovem disse, em depoimento, que uma das pessoas que estava na casa, Eduardo Purkote, teve papel decisivo no crime, mas o MP-PR afastou essa possibilidade.
Eduardo Purkote chegou a ser preso temporariamente durante as investigações e foi indiciado por lesão corporal grave, mas depois teve a prisão revogada.
Sete réus
A denúncia foi aceita no dia 28 de novembro. Veja, abaixo, pelo que cada um virou réu:
- Edison Brittes Júnior – homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver, fraude processual, corrupção de menor e coação no curso do processo;
- Cristiana Brittes – homicídio qualificado por motivo torpe, coação do curso de processo, fraude processual e corrupção de menor;
- Allana Brittes – coação no curso do processo, fraude processual e corrupção de menor;
- Eduardo da Silva – homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver, fraude processual e corrupção de menor;
- Ygor King – homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver, fraude processual e corrupção de menor;
- David William da Silva – homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver, fraude processual, corrupção de menor e denunciação caluniosa;
- Evellyn Brisola Perusso – denunciação caluniosa e falso testemunho.
A defesa da família Brittes disse que está certa de que, nas audiências de instrução e julgamento, a Justiça “finalmente poderá apurar com precisão todos os fatos, trazendo por meio de provas, testemunhas e todo o aparato técnico e forense a realidade daquilo que de fato ocorreu naquele dia”.
A defesa de Evellyn Brisola Perusso disse que vai se manifestar ao longo desta segunda-feira.
Em nota, o advogado de Eduardo da Silva, Edson Stadler, disse que a defesa “pleiteou inquirições de oito testemunhas, das quais peritos técnicos assistentes. Seja médico-legal, em relação ao “corpo” e ainda quanto à dinâmica dos fatos ocorridos. A pretensão é covalidar a versão do réu Eduardo, descaracterizando a peça inicial acusatória”.
O G1 aguarda o retorno da defesa de Ygor King e David Silva.
Daniel
Daniel Correa Freitas nasceu em Juiz de Fora (MG) e jogou pelo Coritiba, em 2017, quando conheceu a família Brittes.
Ele estava emprestado pelo São Paulo ao São Bento. O jogador foi revelado pelo Cruzeiro e jogou pelo Botafogo e pela Ponte Preta também.
O corpo dele foi velado e enterrado em Conselheiro Lafaiet (MG), cidade onde mora a família.