A legislação que rege o licenciamento ambiental no Brasil foi tema de discussão entre diversos setores na manhã desta segunda-feira (24.06). Assembleia Legislativa de Mato Grosso e Câmara Federal dos Deputados apresentaram para a sociedade as linhas gerais sobre a discussão que pretende criar regras claras e objetivas para os procedimentos que visam mitigar os impactos ambientais das atividades econômicas. O debate acerta de uma lei geral já existe há 15 anos desde que o projeto de lei 3.729 foi apresentado pela primeira vez à sociedade em 2004 com o objetivo de regulamentar o inciso IV do § 1º do art. 225 da Constituição Federal.
O deputado federal Neri Geller, que presidiu a Audiência Pública realizada no auditório René Barbour, destacou que ao lado de grandes projetos como a reforma da previdência, a aprovação da Lei Geral do Licenciamento Ambiental é um dos temas prioritários para o desenvolvimento econômico do Brasil e de Mato Grosso. Em âmbito regional, Geller citou os exemplos das rodovias federais 174 e 242 que cruzam Mato Grosso e que não avançaram devido ao licenciamento ambiental.
Em consonância com o parlamentar, o governador Mauro Mendes ressalta a importância de que o Congresso Nacional abrace pautas importantes para o país. “Além da reforma da previdência, temos outros temas que podem ajudar a criar uma nova perspectiva para esse país. O projeto de licenciamento ambiental que vai criar celeridade, que vai criar regras claras que vai permitir proteger o meio ambiente e não dificultar o desenvolvimento econômico”, defendeu o chefe do executo estadual.
Para o presidente da Casa de Leis mato-grossense, deputado estadual Eduardo Botelho, é importante que a nova legislação traga o desenvolvimento econômico em consonância com os recursos naturais, que são finitos. Ele lembrou que o debate é fundamental para Mato Grosso uma vez que o Estado abriga três dos principais dos biomas brasileiros.
Relator do projeto, o deputado federal por São Paulo, Kim Kataguiri, explicou à plateia que o principal objetivo da Lei Geral do Licenciamento Ambiental é trazer regras mais claras e suprir um vácuo legislativo que existe desde a promulgação da Constituição Federal em 1988. “Não podemos, por exemplo, ter condicionantes que não tragam a efetiva defesa do meio ambiente. O modelo atual não contempla nem a defesa do meio ambiente e nem o desenvolvimento econômico para que tenhamos o efetivo desenvolvimento sustentável do País”, enfatizou o parlamentar prevendo entregar o relatório nas próximas duas semanas.
O cacique xavante Bartolomeu Partira Pronhopa lançou um apelo para que a legislação seja feita de forma limpa e clara. “Acreditamos no desenvolvimento sem agredir o meio ambiente e respeitando todas as culturas em um modelo de economia em que todos participem e todos os povos sejam consultados”.
A importância de se consultar os povos tradicionais foi lembrada pelo superintendente interino no Ibama em Mato Grosso, Augusto Castilho, uma vez que o Brasil é signatário de convenções internacionais e que essas premissas são importantes para assegurar a competitividade do produto brasileiro no mercado internacional. “O licenciamento visa justamente garantir a sustentabilidade dos empreendimentos que utilizam os recursos naturais”, pontuou o servidor do Ibama.
De acordo com a secretária de Estado de Meio Ambiente, Mauren Lazzaretti, a legislação deve conciliar todas as visões sobre o tema para abarcar os interesses da maioria da sociedade. Ela defende ainda que os Estados tenham protagonismo na discussão uma vez que 90% dos licenciamentos são realizados pelos entes federativos.
Sema defende protagonismo dos Estados na discussão, já que 90% dos licenciamentos são realizados pelos entes federativos.
Segurança na caneta
O deputado federal Kim Kataguiri enfatizou em sua fala que atualmente os licenciamentos ambientais são regulamentados por um arcabouço de mais de 70 mil leis conferindo insegurança jurídica a todos os atores envolvidos no processo de análise de licenciamentos. “O que queremos é que o servidor tenha segurança na caneta e possa de forma célere dizer sim ou não ao empreendedor”, completou.
O deputado estadual Orlando Bortolini concorda com a importância de que haja mais clareza nos procedimentos. “O que vemos hoje é muitos servidores evitarem tomar decisões para não correrem o risco de serem penalizado”.
Na mesma linha, a secretária Mauren explica que a insegurança ocorre, porque muitos procedimentos e orientações são definidos por normas infraconstitucionais acarretando em entendimentos e pareceres diversos e até mesmo antagônicos. Ela defende que os estudos obrigatórios para os licenciamentos sejam definidos em legislação e não por resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
De acordo com o consultor técnico da Frente Parlamentar Agropecuária da Câmara dos Deputados, Vicente Silva, a constituição definiu que o Estado, em suas três esferas, deve cuidar do meio ambiente por meio do licenciamento, mas que a lei complementar 140 definiu regras sem que antes fosse aprovada uma lei geral definisse as diretrizes: “É como se tivéssemos construído as paredes de uma casa sem os devidos alicerces”.
Diferentes impactos
Outro ponto amplamente defendido pela Sema é a correta diferenciação dos graus de impacto poluidor das diversas atividades econômicas. “Há que haver uma diferenciação clara entre os empreendimentos de significativo impacto ambiental e aqueles de menor grau ofensivo para que o órgão ambiental concentre seus esforços em avaliar e analisar os empreendimentos que podem efetivamente causar impactos ao meio ambiente e à saúde pública”, esclareceu Mauren.
Ela explica que a Constituição Estadual já prevê diferentes tipos de licenciamento com a emissão de licenças e um cadastro para as atividades de menor potencial poluidor e que a norma federal deve ter o cuidado de trazer esse olhar diferenciado para as atividades.
De acordo com Kataguiri, o projeto visa, dentre outras coisas, a correção das falhas nos Estudos de Impacto Ambientais (EIA) para melhorar a qualidade dos trabalhos entregues à população. “Grandes empreendimentos continuam tendo necessidade de apresentar o EIA/RIMA e o licenciamento segue trifásico, mas os órgãos ambientais têm prazo, os órgãos intervenientes têm prazo”, reforçou.
Licenciamento no campo
Durante a audiência pública, também foi abordado as condições para o licenciamento das atividades de agricultura, silvicultura e pecuária. “Para a atividade agrossilvipastoril, que acredito que seja o maior interesse de Mato Grosso, já existe um consenso para um processo simplificado ou pela CAR [Cadastro Ambiental rural] ou por uma licença de adesão e compromisso. Mas já existe um acordo entre ambientalistas e ruralistas para termos um texto simplificado e objetivo”.
A secretária Mauren defende que o CAR seja a alternativa escolhida para validação da atividade produtora. “Dentro do Simcar [Sistema Mato-grossense de Cadastro Ambiental Rural] já é possível enxergar toda a propriedade com seus ativos e passivos ambientais e a ferramenta permite ainda implementar e avaliar as políticas públicas”, explicou a gestora lembrando que a licença seria mais um item para que os órgãos ambientais executem.
Órgãos intervenientes
Kim Kataguiri, explicou também que a tendência é que os órgãos intervenientes não tenham poder vinculante no licenciamento ambiental, assumindo um papel consultivo. “Ou seja, aquilo em que eles opinarem não precisa necessariamente ser acatado como é feito em boa parte do mundo. Somos signatários de uma convenção da OIT que nos obriga a ouvir a toda população afetada, o que todos os países fazem, mas apenas o Brasil interpreta essa resolução como um parecer vinculante”, explicou listando como órgãos intervenientes o ICMBio, Fundação Palmares e Iphan.
Para o deputado Neri Geller, é importante que o os órgãos intervenientes passem a ter caráter consultivo para simplificar e imputar responsabilidade à iniciativa privada: “Não podemos ter obras importantes como a BR-242 atrasadas por tanto tempo por conta de órgãos intervenientes que acabam segurando o investimento nesse importante eixo de estruturação”.
De acordo com a secretária Mauren, a ação dos órgãos intervenientes é um dos fatores que mais impactam no processo de licenciamento. “A lei complementar 140 trouxe a figura da intervenção de terceiros e hoje uma reclamação recorrente da sociedade é que o licenciamento demora demais. Na análise feita por uma consultoria em 2016 e 2017 a intervenção de terceiros foi apontado como um dos itens que mais impacta no tempo de licenciamento”, relatou.