Idosos são res­ga­tados em es­tado de aban­dono

Graças ao pro­jeto Ri­bei­rinho Ci­dadão, re­a­li­zado no mês de fe­ve­reiro pelo Poder Ju­di­ciário de Mato Grosso e ins­ti­tui­ções par­ceiras, o olhar do Es­tado chegou até dois idosos de 84 e 86 anos que es­tavam aban­do­nados, vi­vendo em con­di­ções to­tal­mente de­gra­dantes, pas­sando fome, sem me­di­ca­mentos, em meio a pa­ra­sitas, en­tu­lhos e ma­tagal, iso­lados no Vale Aben­çoado, vi­la­rejo do mu­ni­cípio de Santo Antônio de Le­verger.

Os ir­mãos André Ro­dri­gues da Silva e Abílio Ro­dri­gues da Silva moram so­zi­nhos no Vale há mais de 20 anos. Nos úl­timos anos, com a idade avan­çada, as fun­ções ro­ti­neiras se tor­naram muito di­fi­cul­tosas, pois ambos pos­suem ca­ta­rata em es­tágio avan­çado, de modo que a visão é muito li­mi­tada; André não con­segue ficar ereto por pa­to­lo­gias graves na co­luna; Abílio também tem pro­blemas au­di­tivos e ambos são hi­per­tensos.

A de­núncia da si­tu­ação ca­la­mi­tosa em que se en­con­travam os idosos chegou à co­or­de­na­dora do Centro de Re­fe­rência Es­pe­ci­a­li­zado de As­sis­tência So­cial (CREAS) de Santo Antônio, Carla Ito, du­rante o Ri­bei­rinho Ci­dadão, ao qual ela es­tava tra­ba­lhando como vo­lun­tária.

Quando Carla chegou ao ca­sebre onde moram, se as­sustou com a si­tu­ação: só havia arroz, feijão e açúcar para comer, um dos col­chões es­tava cheio de vermes, a casa toda tinha mau cheiro, os dois es­tavam sem tomar banho há meses e havia vá­rios me­di­ca­mentos ven­cidos. “Eu chorei quando vi os dois na­quelas con­di­ções, idosos, so­zi­nhos. A casa es­tava ex­tre­ma­mente suja, muito lixo, com bicho, não tinha como en­trar”, re­lata.

Ime­di­a­ta­mente, a co­or­de­na­dora mo­bi­lizou a equipe do pro­jeto, que tomou todas as me­didas pos­sí­veis para au­xiliá-los. Abílio e André foram le­vados até o local onde es­tavam sendo re­a­li­zados os aten­di­mentos no Vale Aben­çoado, no dia 24 de fe­ve­reiro, pas­saram por ava­li­ação mé­dica, re­ce­beram me­di­ca­mentos, ti­veram seus do­cu­mentos che­cados, bem como os be­ne­fí­cios da apo­sen­ta­doria – que, de acordo com in­for­ma­ções pre­li­mi­nares, es­tavam sendo sa­cados por fa­mi­li­ares sem o re­passe de­vido aos idosos.

A equipe do CREAS es­teve no­va­mente na re­si­dência dos idosos no dia 27 de fe­ve­reiro para ela­borar o re­la­tório psi­cos­so­cial, a fim de sub­si­diar os pró­ximos trâ­mites le­gais que serão feitos pelo Mi­nis­tério Pú­blico Es­ta­dual.

“Nessa vi­sita, cons­ta­tamos que existe uma au­sência de cui­dados, uma si­tu­ação de ne­gli­gência e aban­dono. A fa­mília pa­rece que tem pouquís­simo con­tato com eles. Pu­demos le­vantar o his­tó­rico, desde a vinda deles para cá e como têm vi­vido até agora, de uma forma muito pre­cária”, ob­serva a psi­có­loga do CRAS de Santo Antônio, Le­o­cádia Pio Sales.

“A si­tu­ação deles é gra­vís­sima, não tem como es­perar. Não tem como con­ti­nu­arem aqui, eles pre­cisam de um lugar que seja digno”, com­ple­menta a as­sis­tente so­cial Alair Al­meida Ca­macho.

Aban­dono – Ques­ti­o­nados sobre a si­tu­ação de aban­dono em que se en­con­tram, os idosos con­firmam o sen­ti­mento: “o filho deve cuidar do pai, porque ele que criou do filho, agora ele que tem que cuidar de nós”, afirma André. “A gente fica aban­do­nado, fica so­zinho aqui”, com­pleta Abílio.

O apoio dado pela equipe do CREAS, pela co­mu­ni­dade e pelos par­ceiros do Ri­bei­rinho Ci­dadão já ame­nizou em partes o so­fri­mento dos idosos. Foi feita uma lim­peza na casa, eles re­ce­beram a vi­sita de fa­mi­li­ares, ali­mentos foram do­ados e vá­rios vi­zi­nhos se pro­pu­seram a ajudar. En­tre­tanto, esse é um tra­balho que deve ser con­tínuo e cau­te­loso, con­forme res­salta o juiz-co­or­de­nador do Ri­bei­rinho Ci­dadão, José Antônio Be­zerra Filho.

“Já houve uma me­lhora sig­ni­fi­ca­tiva na vida desses dois idosos. Eu vou acom­pa­nhar isso, a ação do Mi­nis­tério Pú­blico foi pas­sada ao juízo com­pe­tente, o pro­motor está acom­pa­nhando pari passu essa si­tu­ação para tomar as ações cí­veis e cri­mi­nais per­ti­nentes. Exige cau­tela, muito cui­dado, porque ao tirá-los de lá ou não dar um su­porte ne­ces­sário, com cer­teza o óbito virá. Nós temos que fis­ca­lizar, de forma que não pos­samos mais deixá-los em total aban­dono”, ana­lisa o ma­gis­trado.

O Pro­jeto Ri­bei­rinho Ci­dadão é de­sen­vol­vido pelo Poder Ju­di­ciário do Es­tado de Mato Grosso junto com a De­fen­soria Pú­blica e de­mais par­ceiros para levar dig­ni­dade, jus­tiça e ser­viços de saúde à po­pu­lação ri­bei­rinha do baixo pan­tanal. Este ano o pro­jeto foi re­a­li­zado entre os dias 4 e 25 de fe­ve­reiro.

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