Liderados por Terra Nova do Norte (a 643 km de Cuiabá), 40 municípios respondem por quase 60% da produção de leite em Mato Grosso, segundo dados da Pesquisa Pecuária 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Deste total, boa parte está na área de abrangência de três das maiores cooperativas do setor.
O leite é a principal atividade para 5,8 mil propriedades organizadas no sistema cooperativo, responsável por 30% de sua industrialização no Estado.
No entanto, segundo Diagnóstico da Cadeia do Leite de Mato Grosso, elaborado pelo Sistema OCB e Senar em 2012, cerca de 90% destes cooperados convivem com fatores limitantes ao crescimento de sua produção (considerada ínfima, se comparada aos maiores produtores nacionais), como baixa produtividade, má qualidade e sazonalidade na retirada, resultado da falta de profissionalização, gerenciamento e carência de assistência técnica.
Apesar destas dificuldades, a atividade leiteira é vista como excelente oportunidade. É o que pensam Mauro Machado Vieira, analista de Desenvolvimento do Sistema OCB Mato Grosso, e Orlando de Oliveira Junior, analista de Transferência de Tecnologia da Embrapa.
Leite a pasto
Para Mauro Vieira, da OCB, o problema é que a maioria ainda produz menos de 100 litros diários. Segundo ele, a proposta do programa Leite a pasto, desenvolvido para o micro e pequeno produtor, é contribuir para alterar esta realidade.
“Uma das características do programa é o produtor usar o que tem, especialmente intensificar o uso da pastagem, já que pasto volumoso é o alimento mais barato na composição da dieta da vaca. E como temos riqueza de pastagem no Brasil, nada mais racional do que aproveitarmos estes recursos da melhor maneira”, afirma.
Entre os pontos vitais do Leite a pasto estão a localização e distribuição da água, divisão de pastagens, sombreamento, reservas estratégicas de alimentos para os períodos antes e durante a seca, adoção de calendário zoosanitário e preservação ambiental.
É importante, diz Mauro Vieira, a análise, correção e conservação do solo, adubação, escolha da forrageira, melhoramento genético, irrigação em épocas estratégicas e adoção de um programa de gerenciamento.
“No início do programa, muitos não conhecem o potencial de sua propriedade e de seus animais. Porém, durante o desenvolvimento do programa começam a descobri-las e ficam admirados por não saber o que sua propriedade lhes propiciava. Temos exemplos de produtores que chegam a dizer ‘hoje uso apenas 25% de minha área”.
O analista da OCB Mato Grosso explica que o programa começou a ser desenvolvido em 2014, envolvendo três grandes cooperativas – Coopnoroeste (Araputanga), Coopernova (Terra Nova do Norte) e Campileite (Campinápolis) – e, atualmente, Coopropan (Juína) e Cooperprata (Brasnorte).
“Atua em mais de 30 municípios mato-grossenses, com cerca de 3.200 famílias organizadas no modelo cooperativista. Os indicadores desejados, ao final do programa, são elevar a média geral de 150 litros para 300 litros dia por propriedade, redução da sazonalidade na produção, atualmente em 60% (o que impede os laticínios de trabalharem com sua capacidade máxima) e adequação da qualidade de acordo com as normas do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa)”.
Pesquisa e logística
Para o analista de Transferência de Tecnologia da Embrapa Agrosilvopastoril, de Sinop (480 km distante de Cuiabá), Orlando de Oliveira Junior, Mato Grosso “tem tudo para ser um dos maiores produtores de leite do país. Temos clima, alimentação, produção de grãos e forragem o ano inteiro, se for irrigada”.
Segundo ele, para atingir este estágio a pecuária leiteira mato-grossense, formada basicamente por produtores familiares, precisa investir em logística, incluindo melhor distribuição de energia elétrica, assistência técnica e pesquisas.
“Temos que trabalhar a demanda do Estado, a realidade local. Não é o capim bom lá do Sudeste que vai dar certo aqui. Este é o papel da pesquisa. Aqui em Sinop, desenvolvemos alguns trabalhos no estado em sistema ILP (Integração Lavoura, Pecuária, Floresta), mas o resultado destas pesquisas, nossas ou de outras instituições, não chegará ao produtor se não houver uma assistência técnica qualificada”, argumenta.
Atualmente, basicamente toda a produção industrializada no Estado é vendida no Sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro e, agora, Vitória) e uma mínima parte para o Norte do país. “Mas ainda é um leite sem qualidade. Portanto, não adianta aumentar a produção, se não melhorar a qualidade. Cito muito Santa Catarina, onde evoluíram muito tanto na quantidade como na qualidade. É um exemplo a ser seguido”.
Ele alerta também sobre o uso de resíduos de etanol de milho na alimentação de vacas leiteiras. “É uma coisa nova, usada indiscriminadamente, sem se saber o que pode acarretar no futuro – de problemas digestivos à qualidade do leite dessa vaca”, conclui.