O Mato Grosso, localizado no Centro-Oeste brasileiro, possui, em seu território, três tipos de biomas: Pantanal, Cerrado e Amazônia. A biodiversidade é marca registrada do Estado de 903.357 km² que faz divisa com a Bolívia e tem como marca o recebimento das culturas paraguaia, goiana, mineira e sulina (mais recente). Na nossa viagem de uma semana foi possível conhecer o Pantanal e o Cerrado.
A aventura começa no último município antes da entrada na Transpantaneira (MT-060), uma via de terra, com 147 km de extensão, entre Poconé, portal do pantanal mato-grossense, e a localidade de Porto Jofre. O caminho, na sua totalidade, possui 124 pontes, a maioria delas de madeira. Para atravessar de ponta a ponta, o ideal é a utilização de um veículo 4×4, já que o terreno é todo de chão batido. A estrada, assim como todo pantanal, possui ciclos.
A região se transforma a cada seis meses. No período das cheias, de novembro até abril, grande parte dos campos fica alagada. As chuvas enchem as cabeceiras dos rios e a água desce para a região pantaneira. Quando a chuva diminui e a seca passa a imperar, o período da vazante começa, normalmente de junho até novembro, quando o ciclo recomeça. E é justamente no período mais seco, a alta temporada do pantanal. Pois é nesse momento em que os animais começam a aparecer.
Observação da onça pintada
Pela estrada de terra crivada de “costela de boi” (como os locais chamam as pequenas e contínuas corrugações) o automóvel vai trepidando. Nos dois lados da rodovia é possível, com um olhar atento, ir conhecendo e tendo a oportunidade de contemplar a fauna e a flora desse local tipicamente brasileiro. Sem grande esforço consegue-se observar tucanos, cervos, capivaras e suas enormes famílias, jacarés, pássaros, acauã, colhereiro, socó-dorminhoco e o Tuiuiú, uma ave de corpo branco, cabeça preta e o pescoço vermelho, que passa dos dois metros de envergadura e faz grandes e solitários ninhos no alto das árvores.
Vitório Justino da Silva, 64, pai de nove filhos, foi o nosso guia durante toda viagem e cumpre essa função há 37 anos, quando decidiu sair de Goiás para conhecer as belezas do pantanal. Se apaixonou e ficou. Hoje em dia, com os roteiros regulares (saída de manhã e volta no mesmo dia), pode ir para o pantanal todos os dias da semana. Sorridente e bem-disposto, “seu Vitório” fala com um brilho no olhar sobre a região que ele viu se tornar referência em observação de onça-pintada:
– Há 10 anos, se eu visse uma pegada de onça, eu ligava para os outros guias e aquilo virava assunto de semanas. Hoje, a gente vê onça quando quer. Melhorou muito – fala com satisfação.
O felino parece ser o grande produto da região. O secretário adjunto de Mato Grosso, Alan Barros, destaca que a preservação começou justamente pelos fazendeiros, que viram no turismo, uma grande oportunidade de negócio. A fazenda Piuval é um exemplo dessa mudança. Fundada com o objetivo de cuidar de cavalos e criar gado, o estabelecimento decidiu mesclar e desde 1989 recebe turistas.
– Percebemos que a chegada do turista para ver a nossa natureza acabava pagando o número de cabeça de gado abatido pelas onças do pantanal – resume de forma pragmática João Losano, proprietário da Piuval.
– A gente chega a cansar de ver a mesma (onça) parada e fotografar. Logo a gente inicia o trajeto no rio novamente para ver se consegue avistar alguma outra caçando, em ação – explica Lucas Buturra, engenheiro ambiental e guia no Mato Grosso.
Na área pantaneira, os barcos, conhecidos como “voadeiras”, lanchas compridas e finas de alumínio cortam o pequeno Rio Claro. Nele, é possível avistar, ao pôr do sol principalmente, os ninhais, locais em que milhares de garças, biguás, entre outros escolhem para fazer os ninhos. É um momento em que a mata verde começa a ganhar os tons branco, preto e cinza das penugens das aves.
Também no rio, mas agora no Cuiabá, na localidade de Porto Jofre, na divisa entre Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, os pilotos das lanchas passam com seus rádios conectados e em intensa comunicação. Todos estão aguardando a movimentação das onças, grande atrativo e o principal chamariz turístico da região.
Próximo as barrancas e nas dezenas de semelhantes Igarapés, os nativos prendem o olhar pois sabem que a qualquer momento o felino pode aparecer. Quando alguma surge, e em junho provavelmente acompanhada, tendo em vista a época do acasalamento, um conjunto de lancha se reúne e diversas câmeras fotográficas se anunciam na espera do melhor ângulo do terceiro maior felino do mundo.
Atravessando as águas calmas e ensolaradas, jacarés tomam sol de boca aberta nas primeiras praias que surgem na vazante. Ao lado, trinta-réis preparam ninhos na areia. Antas cruzam de uma margem para outra enquanto lontras nadam de forma apressada. Nos galhos da mata, uma iguana ou sinimbu (nome local) tenta se esconder. Conhecer o pantanal por água e por terra é a melhor maneira de se conectar e entender o tamanho da biodiversidade do local.
A exuberância dos Guimarães
Se a entrada do pantanal fica a aproximadamente 100 km da capital Cuiabá, a Chapada dos Guimarães está a apenas 64 Km, via MT-251. A diferença de um local para o outro fica claro na folhagem. Se antes os campos ainda estavam molhados e as folhas eram verdes, agora o Cerrado se mostra e a poeira avermelhada toma conta do ambiente. Se a água não aparece pelo caminho, isso não quer dizer que ela não se faça presente na região. Segundo o guia Vitório da Silva, foram catalogadas 450 cachoeiras na Chapada dos Guimarães.
E, dentro do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, juntamente com companhia de um guia, é possível conhecer 11 delas. Ao chegar ao local, logo à direita, há um mirante para avistar a queda da cachoeira “Véu da noiva”.
Hoje em dia não é mais possível chegar próximo a ela. Porém, lá do alto do mirante, observa-se a queda d’água enquanto um casal de arara-vermelha passa gritando. Agora, quem quer se refrescar e aproveitar para se banhar nas águas transparentes das cachoeiras, basta fazer uma trilha de 7 Km. Para conhecer as belezas do local, não é preciso pagar ingresso, mas é necessário a contratação de um guia e a maioria dos passeios precisa ser agendado.
Em outra localidade, mas pertencente também ao Parque Nacional, está a Cidade de Pedra. Com acesso pela MT-020, também conhecida por estrada da “Água fria”, que começou a ser asfaltada, o visitante chega a mirantes na beira dos paredões da Chapada dos Guimarães, onde se pode contemplar o Vale do Rio Claro e morrarias num desnível de aproximadamente 350 metros.
Para chegada ao local, é necessário um guia e um carro com tração 4×4. No caminho, a areia fofa, o sol escaldante e a poeira dão amostra de uma parte do Cerrado. O local é cercado por montanhas de arenito vermelho que brilham mais intensamente com a luz do sol, criando novos tons de cores que lembram um braseiro. Nos últimos tempos, principalmente depois da Copa do Mundo de 2014 disputada no Brasil, em que Cuiabá foi sede com a Arena Pantanal, o turismo no local cresceu muito.
Por outro lado, o interesse pelo local não parou aí. Lena Espindola, 21 anos atuando como guia no Mato Grosso e Fabricia Campello Acosta, também guia, alertam sobre os riscos que a Chapada vem correndo.
– Piorou a preservação (da natureza) nos últimos anos. Há mais destruição. A gente mora aqui há muito tempo, e a gente viu e acompanhou a pressão do agronegócio aqui na Chapada. O Parque Nacional sofre pressão de todos os lados. O agronegócio e a exploração imobiliária tentam conseguir sempre mais. E o Parque é pequeno, são só 33 mil hectares. A soja invadiu. É uma reserva super importante e sofre pressão de todos os lados. Do agronegócio e da exploração imobiliária. Muito condomínio surgindo, um atrás do outro. Houve um boom imobiliário na Chapada, muita gente que vivia em Cuiabá veio morar na Chapada em busca de qualidade de vida – explica Fabricia.
Onde nascem os rios em MT
Saindo de Cuiabá, pegando a estrada MT-010 por cerca de 123 Km, muito danificada em certos trechos, está localizado o município de Nobres. Nobres possui distritos encantadores como é o caso de Bom Jardim, a 65 km de distância da prefeitura municipal. A história inicial do local envolve um grande proprietário, dívidas e uma pequena reforma agrária. A área tem uma extensão de 50.000 hectares e pertencia a um fazendeiro carioca.
O latifundiário não quitou suas dívidas e o Banco do Brasil tomou o local para si. No governo de José Sarney (1985 -1990), o ministro da Reforma e do Desenvolvimento Agrário, Dante de Oliveira, dividiu vários terrenos em 100 hectares para cerca de 70 famílias. Segundo os filhos desses primeiros beneficiados da reforma, essas famílias acabaram jogadas a própria sorte e a maneira de sobreviver foi empreender. A segunda geração de herdeiros da medida de Dante de Oliveira optou então por construir pousadas e investir no turismo.
O local é pacato, possui cerca de 500 habitantes e em muitos pontos não há sinal de celular. Com uma natureza conservada, a região de Nobres se destaca pela fauna e flora, mas principalmente pelos rios e cachoeiras. A cachoeira do Serra Azul, pertencente a Rosário Oeste, fica a 470 degraus de distância.
É uma subida fácil, toda demarcada e acompanhada por um guia, dentro de um espaço que hoje é cuidado pelo Sesc. Depois da íngreme caminhada, o visitante tem a oportunidade de contemplar uma bela queda d’água e mergulhar numa água azul, rodeado de peixes.
O diferencial de Bom Jardim está nas nascentes dos rios. Em alguns pontos, fazendo o agendamento da visita e combinando o passeio com um guia, é possível se encantar com as águas celestes e cristalinas da nascente do Rio Salobra. Em uma leve descida conduzida apenas pela correnteza, munido de máscara, snorkel e calçado, o turista mergulha no mundo azul da fauna subaquática.
A chamada flutuação dura aproximadamente 1h30min e é o ponto alto da visitação. Para quem gosta de um pouco mais de adrenalina e não se contenta em apenas observar, há a opção de descer o rio Quebó em cima de uma boia, é o boia cross. O trajeto é seguro e dura aproximadamente 1h, com direito a passagem por uma caverna de 400m de calvário, cheia de morcegos.
Mato Grosso possui belezas ímpares, como o pantanal, selvagem, com uma fauna e flora ricas e diversificadas.
A Chapada dos Guimarães mostra a grandiosidade e imponência da natureza do Cerrado brasileiro. Enquanto a localidade de Nobres apresenta uma beleza pura, com nascentes e cachoeiras transparentes.