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ECONÔMICA

Produção de etanol de milho dispara mesmo com ambiente frágil

Foto de Jesse Gardner na Unsplash

Quando o presidente Lula decidiu voltar a cobrar impostos sobre a gasolina e etanol no Brasil, dia 27 de fevereiro – pondo fim às isenções decorrentes de uma manobra considerada eleitoreira de seu antecessor, Jair Bolsonaro – o governo anunciou que as alíquotas seriam diferentes para cada tipo de combustível. Enquanto a taxação da gasolina significou um aumento, na distribuidora, de R$ 0,34 por litro, o etanol, popularmente chamado de álcool, subiu apenas R$ 0,02. A decisão foi baseada na premissa ecológica, já que o etanol é um biocombustível – substância que tem vantagens ambientais por emitir menos gases de efeito estufa em relação ao seu parente fóssil, no caso a gasolina.

Mas o aumento da demanda por energia verde, aliada à suspensão judicial do plantio de cana-de-açúcar na Amazônia, elevaram o milho a um posto de destaque entre as matérias-primas do etanol. Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a produção de etanol de milho disparou quase 800% nos últimos cinco anos, passando de 520 milhões de litros, na safra 2017/18, para 4,5 bilhões na safra 2022/23. E a perspectiva é alcançar 10 bilhões de litros até 2030.

“O milho entrou porque a cana-de açúcar está proibida na Amazônia”, explica Lucas Ferrante, doutor em ecologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia.

Nesse sentido, cientistas e organizações da sociedade civil alertam para os impactos socioambientais dessa produção no Brasil, onde as lavouras de milho avançam sobre áreas da Amazônia e do Cerrado, podendo ser um vetor de desmatamento destes biomas, ainda que indireto. E há também temor de que comunidades tradicionais que habitam essas regiões deixem de produzir alimentos para plantar o grão, mirando nesse mercado emergente.

“O etanol de milho tem se mostrado uma alternativa promissora para a substituição dos combustíveis fósseis, mas o impacto desse tipo de produção dependerá das condições em que o grão é cultivado e processado”, avalia Carmem Araújo, diretora administrativa no Brasil do International Council on Clean Transportation (ICCT, ou Conselho Internacional de Transporte Limpo, na tradução para o português), organização que acompanha mundialmente discussões sobre leis ambientais.

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) ponderou, em nota enviada à Repórter Brasil, que a produção de etanol de milho, assim como outros biocombustíveis, deve obedecer às leis ambientais e ao zoneamento que estabelece em quais áreas é possível desempenhar esse tipo de atividade econômica. A pasta também afirmou que o Governo Federal atuará em programas de mitigação e adaptação à mudança do clima – o que inclui a produção de alternativas aos combustíveis fósseis. “Agora, todos os ministérios têm a missão de incorporar em suas políticas ações voltadas a combater as mudanças climáticas”. Leia aqui as respostas na íntegra.

Aumento da demanda por terras

Em 2021, segundo dados do IBGE, foram produzidas 88,4 milhões de toneladas de milho – 62,8 milhões foram de lavouras plantadas após o cultivo e colheita da soja, o chamado “milho safrinha” ou “segunda safra”. A perspectiva é de safra recorde para 2023 e acréscimo 10,4% na área colhida de milho em 2022 em relação ao ano anterior.

A maior parte da produção (36%) está concentrada em Mato Grosso, estado que se divide entre os biomas amazônico e do Cerrado. As 18 usinas de produção de etanol de milho no país também estão todas em uma mesma região, que compreende, além de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e São Paulo.

Por ser plantado na entressafra de outra cultura, como a soja, o milho não é responsável diretamente pelas mudanças no uso da terra, mas pode torná-las mais rentáveis e incentivar o desmatamento de novas áreas de vegetação nativa ou ainda competir com a produção de alimentos. “A produção nacional de milho é bem integrada na cadeia mundial de alimentos e ração animal. Portanto, é inegável que dedicar parte da produção de milho para biocombustíveis pode aumentar a demanda por terras”, observa Araújo, diretora do ICCT no Brasil.

Por isso, o avanço dessa lavoura pode provocar um efeito semelhante ao da expansão da soja na Amazônia: “Os pecuaristas venderam suas terras para sojicultores e migraram para áreas de desmatamento. Os impactos dessa explosão do milho podem ser especulação de terras, desmatamento e grilagem”, explica Lucas Ferrante.

De fato, o plantio de lavouras temporárias, como a soja e o milho, vem pressionando as fronteiras agrícolas do Centro Oeste, sobretudo no Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, além do Matopiba – que descreve a região entre Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Entre 1985 e 2021, a produção de itens da agricultura brasileira triplicou, segundo levantamento da organização MapBiomas. De 2008 a 2019, a produção de soja no Cerrado aumentou 80%; no Matopiba, cresceu 125% – crescimento que se reflete também na produção de milho safrinha, uma vez que ela se intercala com esta lavoura.

A União Nacional do Etanol de Milho (UNEM), entidade que representa as indústrias produtoras do biocombustível, afirmou à Repórter Brasil que o setor possui um sistema de monitoramento da cadeia produtiva. “O milho utilizado para a produção de etanol passa por um controle e rastreamento de origem desde a sua produção na fazenda, passando pela cadeia completa de custódia até chegar na indústria”, declarou a entidade. Leia a resposta na íntegra aqui.

Fome, poluição e pandemia

O pesquisador Ferrante também diz que a produção de biocombustíveis pode prejudicar pequenos agricultores, povos indígenas, pescadores artesanais, entre outras populações que vivem nas áreas para as quais a cultura do milho se expande. “No Pará, por exemplo, você tem o caso de comunidades que aderiram à produção de dendê para biocombustíveis. Eles abriram mão da agricultura de subsistência para isso. O dano social e econômico para as comunidades que aderiram a esse tipo de produção foi enorme”.

A UNEM negou que o crescimento do setor possa ter impactos no quadro de insegurança alimentar. “Apenas o amido do milho é utilizado para a produção de etanol, enquanto que as proteínas, gorduras e fibras retornam ao mercado na forma de óleo de milho e rações proteicas (DDGS) para a produção de aves, suínos, bovinos e peixes”, concluiu.

Já a CNI defende a produção justamente por ser “feita em quase todo o território brasileiro” e “inclusive pela agricultura familiar, o que possibilita maior estímulo ao desenvolvimento regional”. “Além disso, o milho é um insumo mais durável, que pode ser armazenado o ano inteiro, possibilitando a produção ininterrupta de etanol pela usina, evitando a sazonalidade no processo”, completa. Leia aqui a íntegra das respostas aqui.

Não bastante tais ponderações, nos Estados Unidos, a comunidade científica levantou alguns questionamento em um estudo publicado na revista da Academia Nacional de Ciências (PNAS, na sigla em inglês):  pesquisadores afirmam que o etanol de milho falhou em atingir a redução nas taxas de gases de efeito estufa esperada e que evidências científicas sugerem que são necessários mais avanços tecnológicos e políticas públicas para que o etanol de milho se torne uma alternativa viável às fontes de energia não renováveis.

Por aqui, Ferrante integrou um grupo de acadêmicos que levantou evidências sobre a relação do avanço das monoculturas para a produção de biocombustíveis com o risco do início de novas pandemias. As ponderações dos pesquisadores foram divulgadas na revista Science, uma das publicações científicas mais prestigiadas do mundo.

“As cadeias associadas à produção de biocombustíveis podem favorecer saltos zoonóticos [quando um agente infeccioso presente na fauna ou na flora passa a infectar e se espalhar pelos seres humanos], podendo gerar novas pandemias. É um ciclo de produção que não é viável nem econômica nem ambientalmente para o Brasil e também do ponto de vista de saúde pública”, conclui Ferrante.

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Um comentário em “Produção de etanol de milho dispara mesmo com ambiente frágil”

  1. Ovеrall, ᴡе havе found that thе Beosin product dramatically reduced headache аnd increased thhe efficiency of security tests.

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  • 23 de março de 2023 às 17:13:14