A repórter Jéssica Dias, da ESPN, sofreu importunação sexual na noite da última quarta-feira (7) enquanto fazia a cobertura do jogo entre Flamengo e Vélez Sarsfield no programa SportsCenter.
Ela estava nos arredores do Maracanã, no Rio de Janeiro, quando foi beijada no rosto por Marcelo Benevides Silva, um torcedor do Flamengo.
Em depoimento à polícia, Jéssica conta que ela também foi xingada, molestada e beijada no ombro pelo homem.
A repercussão do crime aponta que a repórter foi vítima de assédio sexual. No entanto, Jéssica foi vítima de importunação sexual, que é um crime de caráter diferente ao de assédio, mas tão sério quanto.
Leonardo Pantaleão, advogado, professor e especialista em direito penal, explica que a importunação sexual é definida como “ato libidinoso, atentatório ao pudor, lascivo, em desfavor de alguém. Neste crime, qualquer pessoa pode ser o sujeito ativo: é um crime comum. A vítima – o sujeito passivo – também pode ser qualquer pessoa”. Ou seja, é uma violência que pode ser cometida por qualquer pessoa, em qualquer lugar.
Por outro lado, o assédio sexual é praticado por um superior hierárquivo da vítima, podendo-se ter ascendência a ela em relação a uma função, cargo ou emprego. O intuito dessa violência é ter vantagem sexual sem uso de ameaça grave ou violência. “Em outras palavras: a vítima só pode ser alguém que está subordinado ao autor do crime. Outro detalhe: o assédio sexual tem de ser cometido no ambiente de trabalho ou em um local que tiver conexão com o esse ambiente”, explica o advogado.
A importunação sexual se tornou uma tipificação criminal oficialmente em 2018 , pela lei Lei nº 13.718 e prevê reclusão de 1 a 5 anos; enquanto o assédio sexual tem uma pena menor, de 1 a 2 anos. Jacqueline Valles, jurista e mestre em direito penal, diz que a inclusão desse crime preencheu um espaço nas legislações em defesa das mulheres.
“A lei serve para punir violências contra a mulher que não se classificam como estupro, nem em atentado ao pudor. Como a pena máxima para esse crime é de 5 anos de prisão, cabe a prisão preventiva”, explica. A prisão preventiva nos casos de importunação é um requisito do artigo 312 do Código de Processo Penal (CPP), já que a casos frequentes de reincidência. “Quando um homem tem esse tipo de comportamento em relação às mulheres várias vezes, ele representa um perigo à sociedade local e pode sim ser preso de forma preventiva”, destaca a jurista.
Mayra Cardozo, advogada que atua com desenvolvimento humano e empoderamento feminino, afirma que um dos principais indicadores de quem sofre assédio ou importunação sexual é a saúde mental afetada. Ela aponta que quando a situação acontece em um ambiente de trabalho, há um agravamento da situação devido à Síndrome da Impostora, que acomete grande parte das mulheres.
“A crise de impostora é quando a pessoa sente constantemente que o que você faz não é bom o suficiente”, explica Cardozo. “Quando essas situações acontecem dentro do trabalho, a autoestima e autoconfiança são extremamente abaladas. Isso acontece porque o potencial, a inteligência e dedicação começam a ser questionados, já que essas condutas fazem as mulheres se sentirem como se fossem reduzidas a um corpo”, acrescenta.
Entenda o caso
Enquanto Jéssica Dias se despedia do público do SportsCenter, da ESPN, Marcelo a beijou no rosto. Jéssica imediatamente se mostrou desconfortável e recebeu a solidariedade dos apresentadores Marcela Rafael e Renato Rodrigues.
“Estava indo tão bem. A torcida estava tão legal, e vem um palhaço e termina desse jeito o nosso Sports Center. Jéssica, eu sinto muito. Minha solidariedade a você nesse momento”, destacou Marcela. “Vamos pegar a carinha dele e mostrar para todo mundo”, disse Renato. “É, eu sei o que é porque já passei muito por isso”, acrescentou Marcela.
Mais tarde, Renato usou sua conta no Twitter para falar do assédio: “Enojado com o que acabou de rolar com a Jessica Dias no Maraca. Um velho c*zão, filho da p*ta, beijou nossa repórter no meio do link sem sua permissão. Primariamente, um abraço pra ela. Sinto muito. Segundo, quem tava por perto tinha obrigação de dar um coro no pau no c*”, escreveu.
Renato voltou mais tarde à rede para defender Jéssica de comentários que menosprezavam a violência: “Uma par de gente relativizando um assédio sofrido por uma mina trabalhando, num constrangimento em rede nacional. Jogando clube de coração no meio, política… ‘Ain, mas você não precisa ser agressivo assim’. Já era, deu tudo errado. Isso aqui é esgoto do mundo”, pontuou o apresentador.
Os cinegrafistas da emissora que acompanhavam Jéssica acionaram a polícia, e Marcelo foi levado para a delegacia do estádio. O torcedor do Flamengo foi preso em flagrante e teve prisão preventiva determinada pelo Juizado Especial Criminal. Jéssica prestou depoimento à polícia e não se pronunciou nas redes sociais até o momento.
A conta oficial do Flamengo também se solidarizou com Jéssica: “O Clube de Regatas do Flamengo repudia o assédio cometido por um torcedor rubro-negro com a jornalista da ESPN Jéssica Dias durante a reportagem antes da partida desta noite. É lamentável que atos repugnantes como este, que não representam a Nação Rubro-Negro, ainda aconteçam”.