O Supremo Tribunal Federal (STF) deve começar a votar nesta quarta-feira (7) as ações que questionam a constitucionalidade das emendas do relator, as RP-9, que formam o “Orçamento Secreto” . A data foi definida pela presidente da Corte, Rosa Weber, que também é relatora das ações.
As emendas ganharam esse nome devido à falta de transparência e ausência de critérios escolhidos pelos parlamentares para definir os repasses.
Os ministros vão analisar, em conjunto, quatro arguições de descumprimento de preceito fundamental movidas pelos partidos Verde, PSOL, PSB e Cidadania.
A Procuradoria-Geral da República e a Advocacia-Geral da União pediram que o STF rejeite as quatro ações. Para a PGR e a AGU, a liberação de verbas dessa forma é constitucional.
Orçamento virou moeda de troca
Desde sua criação, em 2020, essas emendas viraram moeda de troca entre Executivo e Legislativo, substituindo o “toma-lá dá-cá”. Ao invés da tradicional troca de cargos por apoio, o governo passou a liberar uma parte do Orçamento.
Para 2023, a Lei de Diretrizes Orçamentária prevê R$ 38 bilhões para as RP-9. A efeito de comparação, o montante previsto para o Ministério do Meio Ambiente é de R$ 2,96 bilhões.
Na visão do professor de economia do IBMEC de São Paulo, Alexandre Pires, o privilégio orçamentário para emendas, em detrimento das despesas discricionárias (livres para investimento do Executivo), se deve à perda de legitimidade do Planalto, que cria uma “disputa pela soberania política”.
“Aconteceu em 2015 com a ex-presidente Dilma Rousseff e agora com o presidente Jair Bolsonaro. Tínhamos um presidente sem base legislativa, debilitado, abrindo espaço para o Congresso ganhar poder em razão de pouca legitimidade nos mandatos, com isso, os parlamentares mudaram a Constituição advocando pra si ali mais poder, tomando pra si o controle do orçamento”, explica.
O especialista pontua ainda que, caso esses repasses sejam extintos pelo STF, o governo deve operar com o que estava previsto no orçamento anterior até que um novo seja votado.
“Há uma repetição do Orçamento. É como se houvesse um certo congelamento das dotações até que um novo conjunto seja votado. Já existe uma LDO perfeita, no sentido que já tem todos os recursos orçamentários necessários, o que seria extinto seriam os complementos”, diz.
Pires avalia que, caso o STF se posicione contra os pareceres da PGR e da AGU, anulando as emendas, o próximo governo deve ter problemas na relação com o Congresso.
“Você só consegue ter Orçamento se o Congresso aprovar. Quem aprova o orçamento não é o judiciário. Então eles podem derrotar as emendas no Judiciário agora, mas o preço a pagar talvez seja ficar sem governabilidade”, opina.
“Porque mesmo que eles vetem as emendas, mesmo que o processo não seja pelo relator, que vá para comissão mista e as emendas sejam votadas lá, como era a tradição. Você nunca ia conseguir votar o orçamento”, completa.
Segundo Pires, a Corte deve encaminhar a decisão para uma espécie de conciliação, fazendo com que os deputados ampliem ainda mais a publicidade das emendas. Mas, ele ressalta que, caso o STF “compre a briga” com o Congresso, essa é uma disputa que os juízes “não podem vencer no longo prazo”.
“O STF vai chamar o Congresso para se manifestar, e eles vão alegar que as emendas são prerrogativa do Legislativo, e assim as decisões precisariam ser revistas pelo Senado, que não tem interesse em extinguir os repasses. Então é um colocando a faca ali né? No pescoço do outro”, comenta.
Entenda o que é o Orçamento Secreto
Todo ano o governo envia o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) e os deputados podem sugerir emendas para anular despesas ou corrigir eventuais erros e omissões, como dita o parágrafo 3.º do artigo 166 da Constituição.
Em 2015 e 2019, as emendas individuais (RP6) e de bancada (RP8) tornaram-se impositivas, respectivamente. A primeira permite que cada parlamentar indique onde quer alocar o dinheiro divididos igualmente entre os deputados. Já na de bancada, deputados do mesmo estado podem indicar a finalidade da verba.
Em 2019, no entanto, o Congresso aprovou uma nova categoria de emenda, as emendas de relator (RP9). Esse dispositivo permite que o deputado que indicou o destino da verba fique oculto e a destinação passa a ser definida pelo relator do Orçamento, que muda ano a ano.
Até o momento, o que se viu foram casos onde as RP9s foram usadas para abastecer cidades do interior com tratores superfaturados e redutos eleitorais de parlamentares de destaque foram contemplados com o “Pix orçamentário”.
Neste ano, por exemplo, houveram as primeiras prisões relacionadas ao Orçamento Secreto, em municípios do Maranhão, por fraudes no Sistema Único de Saúde (SUS), em que as prefeituras registravam atendimentos médicos e consultas que nunca existiram, e enchiam o cofre com dinheiro vindo de emendas parlamentares.
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Fonte: IG ECONOMIA