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Confira as mentiras e distorções de Bolsonaro na entrevista ao JN

Bolsonaro (à esquerda), Renata Vasconcelos e Willian Bonner
Reprodução – 22.08.2022

Bolsonaro (à esquerda), Renata Vasconcelos e Willian Bonner

Inaugurando a sequência de encontros do Jornal Nacional com presidenciáveis, o candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), concedeu uma entrevista ao carro-chefe da TV Globo nesta segunda-feira (22).

Durante a conversa com William Bonner e Renata Vasconcellos, Bolsonaro mentiu e omitiu diversas informações que foram levantadas pelos apresentadores – por exemplo, que não havia xingado ministros do STF (Supremo Tribunal Federal ou que não fez uma imitação de pacientes com falta de ar por decorrência da Covid-19.

Confira a apuração das falas de Jair Bolsonaro durante sua entrevista ao Jornal Nacional:

Ofensas aos ministros do STF e ataques ao sistema eleitoral brasileiro

A primeira pergunta de William Bonner a Jair Bolsonaro se referia aos ataques que o presidente tem feito aos ministros do Supremo Tribunal Federal e às urnas eletrônicas, questionando sua integridade e confiabilidade.

O presidente rebateu dizendo que nunca havia xingado os ministros do STF, o que é uma mentira :

  • Na manifestação de 7 de setembro de 2021, o presidente chamou o magistrado Alexandre de Moraes de “canalha”. O xingamento foi repetido em julho de 2022 após o ministro prorrogar o inquérito que investiga as milícias digitais.
  • Outro ministro que foi ofendido por Bolsonaro é Luís Roberto Barroso, a quem o presidente se referiu como “filho da puta” no dia 6 de agosto de 2021. Poucos dias antes, o mandatário já havia chamado o ministro de “criminoso” e “mentiroso” por suas posições contra o voto impresso. As ofensas de Bolsonaro a Barroso se repetiram no dia 7 de setembro, quando o chefe do Executivo disse que o ministro era um ‘imbecil’ por defender o sistema eleitoral eletrônico brasileiro. “Resposta de um imbecil, lamento falar isso de uma autoridade do STF, só um idiota para fazer isso.”

Ações contra a Covid-19

A entrevista tocou em diversos pontos sobre a ação do governo para conter e minimizar os impactos da Covid-19 no Brasil.

O tópico começou com a seguinte pergunta de Renata Vasconcellos:

“Pandemia, candidato. Nos momentos mais dramáticos o senhor imitou pacientes de covid com falta de ar. Sobre as mortes, o senhor disse “e daí? Eu não sou coveiro”. O senhor estimulou o uso e usou dinheiro público para comprar medicamentos comprovadamente ineficazes contra a covid. O senhor desestimulou a vacinação. O senhor não teme ser responsabilizado se não pelos eleitores pela história?”

Veja a resposta de Bolsonaro para esta e outras perguntas relacionadas à pandemia:

Compra das vacinas contra a covid-19

Bolsonaro disse que o governo federal comprou mais de 500 milhões de doses de vacinas contra a Covid-19 mais rápido do que em outros países.

A afirmação do presidente não é verdadeira. A vacinação contra a Covid-19 foi pioneira no Reino Unido, em 8 de dezembro de 2020. Até o final do mesmo ano, mais de 50 países já tinham iniciado a vacinação. A primeira dose contra a Covid-19 aplicada no Brasil foi em 17 de janeiro de 2021, em São Paulo.

Desde a primeira vacina aplicada no Reino Unido (em dezembro de 2020) até o fim do ano, foi constatado que a farmacêutica Pfizer enviou cerca de 53 e-mails com ofertas de vacinas ao governo brasileiro. As tentativas de contato, no entanto, foram sem sucesso.

O presidente alegou que a farmacêutica não garantia a entrega da vacina. Entretanto, documentos apresentados à CPI da Covid, do Senado, provam que a Pfizer se comprometeu a reembolsar o valor pago pelo Brasil por doses de vacina caso o prazo de entrega fosse descumprido. Essa premissa consta de telegrama diplomático enviado em 27 de agosto de 2020 pela embaixada do Brasil em Washington ao Itamaraty.

Segundo o documento, a empresa “se comprometeria a devolver ao governo brasileiro todo e qualquer pagamento antecipado, na hipótese em que a empresa não consiga honrar a obrigação de entregar a quantidade acordada da vacina”. Na época, a farmacêutica oferecia 30 milhões de doses de vacina contra a Covid-19 ao governo brasileiro.

Relembre aqui  a corrida pelas vacinas contra a Covid-19 nos anos de 2020 e 2021.

Lockdown e distanciamento social

Durante a entrevista, o presidente alegou que a contaminação pela Covid-19 acontece com mais frequência dentro de casa do que fora delas. Além disso, Bolsonaro disse que autoridades de diversos países afirmaram que as medidas de isolamento adotadas durante a pandemia de Covid-19 foram um erro.

A afirmação de Bolsonaro é imprecisa. Quanto ao distanciamento social, o presidente fazia menção a um estudo estadunidense apontando que, de cada três novos pacientes de Covid-19 no Estado de Nova Iorque, nos Estados Unidos, dois estavam em casa. Entretanto, a conclusão do estudo dizia também que estas pessoas, mesmo em suas residências, tiveram contato com pessoas infectadas em algum momento.

Tanto que, em maio de 2020, o governador Andrew Cuomo declarou que a amostragem da pesquisa sobre contaminação domiciliar foi relativamente pequena e que o estado de Nova York registrou uma queda no número de casos após a imposição de medidas de isolamento social, que entraram em vigor no fim de março.

Em 2020, Bolsonaro citava a Suécia como um país modelo no enfrentamento da pandemia, por não ter adotado medidas de restrição tão severas. Entretanto, em junho de 2020, o epidemiologista responsável pela estratégia de ações contra a Covid-19 no país europeu admitiu que ter ido na contramão do mundo pode ter causado mais mortes no país.

Diversos estudos científicos apontaram o isolamento social como uma forma eficaz de conter a transmissão da Covid-19. Em julho de 2020, por exemplo, o British Medical Journal publicou uma pesquisa que mostrou que a abordagem levou a uma diminuição média de 13% na incidência de Covid-19 em 149 países ou regiões.

Covid em Manaus

Em 2020, o estado do Amazonas teve um aumento inesperado no número de casos de Covid,  o que levou seu sistema de saúde ao colapso – principalmente em Manaus. Estima-se que 226 mil pessoas foram contaminadas e 6 mil morreram em decorrência do coronavírus em menos de 20 dias.

Os hospitais não tinham vagas para acomodar os pacientes e nem cilindros de oxigênio para os respiradores, o que intensificou ainda mais a crise da Covid. Os cemitérios ficaram lotados e tiveram que contratar frigoríficos para preservar os corpos que aguardavam um espaço para enterro.

Quanto a isso, Bolsonaro deu a seguinte declaração ao Jornal Nacional:

“Em menos de 48 horas estavam chegando já cilindros lá em Manaus. Lá foi uma coisa atípica, anormal, que aconteceu de uma hora para outra. Menos de 48 horas, cilindros começaram a chegar em Manaus de alguns pontos do Brasil. Fizemos a nossa parte em Manaus.”

Segundo documentos apresentados na CPI da Covid, o então governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), alertou o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello sobre a gravidade da escassez de cilindros de oxigênio em Manaus em 6 de janeiro de 2021. A distribuição efetiva de cilindros e a transferência dos doentes para outros hospitais ocorreu apenas a partir do dia 14 (ou seja, 8 dias depois), quando a crise ganhou projeção nacional.

Vale lembrar também da visita de Pazuello na cidade em 11 de janeiro, quando ele promoveu o uso de medicamentos ineficazes contra a Covid-19.

Pacientes com falta de ar e declarações da OMS

O mandatário negou que teria imitado pacientes com falta de ar por decorrência da Covid-19. Diversos internautas questionaram a afirmação de Bolsonaro nas redes sociais.

O presidente mentiu : em transmissão ao vivo em sua conta nas redes sociais em março de 2020, no começo da pandemia, o presidente imita o som de uma pessoa com insuficiência respiratória ao defender que a população procurasse unidades de saúde apenas se apresentassem sintomas mais graves, argumento que, à época, era pregado pelo então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (União). Confira:

Quando questionado por Renata Vasconcellos se sentia algum arrependimento pelas declarações, o presidente citou a criação do auxílio emergencial, concluindo então que seu governo tratou a pandemia com muita seriedade.

Entretanto, o presidente novamente distorceu uma informação a partir da seguinte fala:

“Agora, não adotei o politicamente correto. Não estimulei. Inclusive, o que eu falei é que quando foi decidido o que era essencial. O trabalho essencial, eu falei: deve ser todo aquele necessário para o homem ou a mulher levar o pão para dentro de casa. A própria OMS concordou comigo naquela questão.”

Bolsonaro distorce uma declaração do diretor-geral da OMS (Organização Mundial da Saúde), Tedros Ghebreyesus, sobre medidas restritivas durante o isolamento. Em 30 de março de 2020, Ghebreyesus disse que os governantes deveriam considerar os impactos sociais e econômicos do confinamento sobre os mais pobres, e ressaltou a necessidade de cada país procurar soluções para evitar que parte da população ficasse desassistida.

Em nenhum momento, no entanto, o diretor-geral defendeu o fim ou o relaxamento das medidas de restrição de atividades, como afirma Bolsonaro.

Governo sem corrupção

“Nós estamos num governo sem corrupção” , disse Bolsonaro a Bonner e Renata.

A afirmação do presidente não é verdadeira : integrantes e ex-integrantes da gestão Bolsonaro são alvos de investigações e denúncias de casos de corrupção e outros delitos ligados à administração pública.

Inclusive, Bolsonaro acabou indo contra uma afirmação que ele mesmo deu em junho deste ano, de que existem ‘casos isolados’ de corrupção no seu governo .

Em junho de 2022, o ex-ministro Milton Ribeiro foi preso preventivamente pela Polícia Federal, acusado de estar envolvido em um esquema de liberação de verbas do Ministério da Educação. Ribeiro é investigado por prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência e foi liberado por meio de um habeas corpus.

O relatório da CPI da Covid-19 no Senado também pediu o indiciamento de Bolsonaro e seis ministros e ex-ministros por crimes como prevaricação, emprego irregular de verbas públicas, falsificação de documento particular e charlatanismo.

Outros atuais e antigos integrantes do governo são investigados pela Polícia Federal ou pelo Ministério Público por suspeitas de corrupção, como o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP); Ricardo Salles (PL), ex-titular do Meio Ambiente; o deputado federal Marcelo Álvaro Antônio (PL), que comandou a pasta do Turismo; e Fabio Wajngarten, que chefiou a Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social).

Centrão

“No meu tempo não era centrão. Não existia centrão”, disse o presidente.

Esta é outra afirmação contraditória do mandatário. Quando Bolsonaro foi eleito para a Câmara dos Deputados em 1990, já existia um bloco parlamentar chamado de “Centrão”, formado na Assembleia Nacional Constituinte de 1987–1988. Parlamentares de diversos partidos integravam o bloco, entre eles o PDC (Partido Democrata Cristão), ao qual Bolsonaro era filiado na época.

O próprio presidente afirmou, em julho de 2021, em entrevista à rádio Banda B, de Curitiba, que integrava o bloco. “Eu sou do Centrão. Eu fui do PP metade do meu tempo. Fui do PTB, fui do então PFL”, disse. Na mesma entrevista, Bolsonaro defendeu o grupo e disse que as pessoas começaram a tratar o “Centrão como algo pejorativo, algo danoso à nação. Não tem nada a ver, eu nasci de lá”.

Empregos

O presidente afirmou que uma “grande reforma na economia” foi feita. E completou dizendo que entre os anos de 2020 e 2021, o Brasil teve “um saldo positivo de quase 3 milhões de empregos”.

O mandatário ainda disse que, em 2014 e 2015, o país perdeu a mesma quantidade de vínculos empregatícios.

Bolsonaro distorceu as informações  em ambas as declarações:

  • Quanto à geração de empregos : segundo os dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), divulgados pelo Ministério do Trabalho e Previdência, foram geradas 2.771.628 vagas de trabalho no mercado formal em 2021. Entretanto, em 2020, não houve saldo positivo: foram fechados 192.746 postos. Foram criados no total, portanto, 2.578.882 milhões de empregos, um número menor do que o citado pelo presidente na entrevista.
  • Quanto ao período entre 2014 e 2015 : de acordo com o Rais (Anuário Estatístico da Relação Anual das Informações Sociais), do Ministério do Trabalho e Previdência, o saldo de carteiras assinadas nos anos citados foi, respectivamente, positivo em 623.077 vagas e negativo em 1.510.703. Sendo assim, ao longo de 2014 e 2015, foram perdidos 887.626 postos de trabalho, não 3 milhões, como afirmou Bolsonaro.

Criação do Pix

Bolsonaro afirmou aos apresentadores do Jornal Nacional que a sua gestão criou o pix (sistema de transferência bancária sem taxas adicionais) “tirando o dinheiro de banqueiros”.

A alegação do presidente é falsa : apesar do lançamento do Pix ter sido, de fato, durante o governo Bolsonaro (em novembro de 2020), a sua criação e desenvolvimento ocorreram em 2016 pelo BC (Banco Central). Na época, o presidente era Michel Temer (MDB).

Além disso, a afirmação de que o Pix teria tirado dinheiro dos bancos não é precisa . Mesmo que as instituições financeiras tenham deixado de arrecadar com tarifas de transações como DOC e TED, o lucro delas parou de crescer. Inclusive, em 2021, os quatro maiores bancos do país lucraram R$ 81,63 bilhões, o maior valor nominal registrado desde 2006 e o quarto maior em números corrigidos pela inflação.

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Fonte: IG Política

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