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JOSÉ RICARDO CORBELINO

Violência doméstica por mais respeito à mulher

JOSÉ RICARDO CORBELINO

Enquanto o mundo luta de forma desigual contra os efeitos da Covid-19, uma “pandemia” paralela e igualmente terrível ameaça de forma silenciosa às mulheres.

Lamentavelmente, o país assistiu perplexa a revelação de Pamella Holanda na última segunda-feira (12), onde ela divulgou vídeos do seu companheiro, DJ Ivis na qual flagrou uma série de agressões contra ela.

Durante séculos o Estado brasileiro negligenciou a questão da violência contra a mulher. Somente após a maioridade da CF/88, foi promulgada a Lei nº 11.340/2006, intitulada Lei Maria da Penha, que extraiu do caldo da violência comum uma nova espécie, qual seja, aquela praticada contra a mulher, nome este escolhido em homenagem à farmacêutica cearense Maria da Penha Maia Fernandes, que sofreu agressões do ex-marido por 23 anos e ficou paraplégica após uma tentativa de assassinato. Após o estatuto legal, de caráter repressivo, mas também, preventivo e assistencial, as mulheres em situação de Violência Doméstica passaram a gozar de especial proteção do Estado.

Não obstante a indiscutível importância da Lei Maria da Penha no enfrentamento à violência contra a mulher, ela não pode ser considerada como um instrumento efetivo no combate a desigualdade de gênero. Falhou o legislador ordinário quando restringiu a atuação da lei, aquele tipo de violência que ocorre no ambiente doméstico ou nas relações íntimas de afeto, condenando a invisibilidade várias formas de violência praticadas contra a mulher, na rua, no trabalho, na escola, no transporte coletivo, na mídia, ou seja, no espaço público.

A Lei nº 11.340/2006 em seu art. 5º configurou violência doméstica e familiar contra a mulher como qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.

A violência doméstica ocorre predominantemente, no interior do domicílio, mas pode ocorrer fora dele, e uma de suas características marcantes é a rotinização, pois incide sempre sobre as mesmas vítimas e pode tornar-se habitual. O agressor é uma das pessoas da convivência doméstica, no caso, pai, marido, tio, sobrinho, filhos, etc. A sociedade, infelizmente, via de regra, é complacente com esse tipo de violência como visto recentemente.

Embora a definição legal de violência doméstica contra a mulher seja baseada no gênero, é perceptível que a noção de violência doméstica não se restringe ao gênero, não absorve somente a condição de vitimização feminina. É, pois, extensiva a todas as pessoas, que, no interior de seus domicílios possam estar sofrendo ofensas, humilhações ou espancamentos, não aos olhos da sociedade.

A sociedade tem um papel de grande relevância na proteção da mulher, visto que a grande causa da violência está no machismo estruturante dessa mesma sociedade brasileira. As pessoas naturalizam a violência contra mulher e não observam que, no dia a dia, em pequenos atos, mulheres são vítimas de violência, discriminação e discursos de ódio apenas pelo fato de serem mulheres.

É comum que mulheres, mesmo em cargos de poder, sejam assediadas da forma que homens não são; é considerado “normal” que um homem sinta ciúmes de sua mulher e impeça determinadas condutas (é até entendido como “cuidado” e “proteção”); é comum que vítimas de violência sejam questionadas nas suas atitudes quando, na verdade, são vítimas.

Nesse diapasão, é importante frisar que a Lei Maria da Penha, ao galgar dos anos, vem contando com alterações necessárias na busca por efetividade. O combate à violência contra a mulher é um trabalho árduo de combate à ideologia machista presente na sociedade. É uma mudança de mentalidade e consciência. Acima de tudo, é dar força à mulher para enfrentar e vencer as agressões, intimidações, assédios, discriminações e inúmeros outros tipos de violência aos quais pode ser submetida durante a vida.

A par disso, temos em Mato Grosso mulheres brilhantes e atuantes nesse tipo de trabalho tanto no Ministério Público Estadual, como na Defensoria Pública na pessoa da estudiosa e incansável colega doutora Rosana Leite Antunes de Barros.

Para que essa mudança ocorra, é necessário, primeiramente, que a mulher tenha noção de todos os mecanismos legais existentes para sua proteção, podendo, assim, saber como agir e usufruir o que é seu por direito, sendo que essa questão é tão complexa e tão profundamente enraizada na sociedade brasileira, que levaremos décadas e décadas de desconstrução de rígidos estereótipos de gênero para formar uma sociedade mais equânime para homens e mulheres, para que se compreendam como pessoas humanas dignas e que merecem e devem respeito entre si.

                       Não se calem, lutem!

JOSÉ RICARDO COSTA MARQUES CORBELINO – Advogado e membro da ABRACRIM.

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